“Hoje mesmo estarás comigo no Paraíso” pela lógica de Pedro

Na lógica de que “um dia pode ser mil anos” está outra alusão à existência do Purgatório, também citada de modo pungente por Lewis em “Oração – Cartas a Malcolm”.

Dimas e Jesus2Aqueles que acusam a Igreja Católica Romana de “inventar” termos que a Bíblia não tem (como a palavra Trindade), no caso aqui, o Purgatório, devem continuar tendo este último termo como perfeito, sobretudo quando bem entendido por quem quer receber maiores porções da verdade divina, pois este é mais um vocábulo que não aparece na LETRA das Escrituras, mas que abunda nas entrelinhas ou no “espírito” iluminado pelo Espírito de Deus. Aqui estamos particularmente pensando numa passagem do evangelho (Lucas 23,43) onde Jesus diz a alguém que acabava de ser salvo por Ele: “hoje mesmo estarás comigo no Paraíso” (no episódio conhecido como “a história dos dois ladrões”). Analisemos mais esta passagem, porque a Escatologia bíblica vai além da imaginação humana..

Lembremos que a pessoa a quem Jesus dirigiu estas palavras era um ladrão, talvez até um assaltante, que tinha posto sob pavor e sob ameaça de armas pessoas inocentes, para lhes afanar os bens comprados com o suor do rosto. Logo, era alguém cuja vida ainda estava “suja”, ou imunda, moralmente falando, por conta e ordem da imensa dívida contraída para com aqueles que roubou, e não teve sequer a chance de fazer como fez Zaqueu, que devolveu tudo o que roubou 4 vezes mais. O que aqui devemos ver, imediatamente, é que devolver aquilo que roubou é apenas uma das coisas que devem ser feitas pelos ladrões, e no meio delas deve estar também um tratamento psicológico, por conta do vício da cleptomania, que sempre adere à alma mesmo quando o indivíduo já roubou tudo aquilo de que precisava. Assim, devolver o roubo – 4 vezes mais – e tratar-se com um psicoterapeuta são apenas 2 (duas) atitudes a serem tomadas por quem quer se regenerar moralmente, e assim passar a ter a vida digna dos verdadeiros convertidos de Jesus (pois conversão sem boas obras é enrolação). Entretanto, há muitas outras obras a serem feitas para inverter o ciclo vicioso dos maus hábitos dos ladrões, na busca por “viciar” a alma na prática de boas obras e no amor à dignidade moral.

Estátua com os crucificadosNeste ponto devemos ver que quando a Igreja Católica diz que o sacrifício de Jesus na cruz não foi suficiente, não está dizendo que Deus não operou tudo o que era necessário para a nossa salvação. Nada disso. Está dizendo que Deus fez tudo o que lhe era possível fazer até o ponto de não interferir contrariamente ao nosso Livre-arbítrio, ficando tudo o mais a cargo do homem, e não de Deus. Ou seja: a boa nova bíblica da perfeição do sacrifício vicário é uma expressão particular de Deus, pois só Ele é perfeito em suas obras! Porém ainda há a parte humana; pois Deus pode perdoar, mas não pode limpar o homem que se sujou voluntariamente. I.e., toda a parte da lavagem interior necessária para o indivíduo alcançar a bondade anímica, caberia então às boas obras do homem genuinamente arrependido de seus erros, embora este pudesse contar com a ajuda de Deus (I Pe 3,18-21), bem como com as orações (suas e de outros), as confissões (públicas e auriculares), as psicoterapias, etc., enquanto – e se – houver boa vontade para corrigir erros do passado que até prazer lhe deram!

Logo, podemos dizer que a salvação é uma coisa; a conversão é outra completamente diferente(*). A primeira Deus garante, “legalmente” falando. A Ressurreição de Jesus é, de fato, a salvação. A fé na própria ressurreição, e as boas obras que consertam o passado de pecados, é, de direito, a salvação. De direito, i.e, significa que Deus já lhe deu a permissão para entrar em seu Reino. Um passaporte. Uma carta de alforria, um salvo-conduto, um selo oficial, ou coisa que o valha. Mas de fato, não, pois o seu estado interior, o controle de suas emoções, o autodomínio moral, a temperança, isto é algo que depende exclusivamente de você. E mais: Lembre que há muitos pecados aprazíveis, e poucos são os prazeres que estamos dispostos a renunciar (dá para ver aqui o valor do celibato?). E por que é preciso este tipo de renúncia parta entrar no Reino?

Entenda: Não para entrar, mas para QUERER FICAR! I.e, quem entrar no céu e ainda mantiver na alma os prazeres e sobretudo os desejos da carne, jamais vai gostar das ofertas disponíveis no céu, e tenderá a entrar em angústia pela ausência dos prazeres em que sua alma se viciou! Com isto, todos os prazeres do céu, perto de quem os maiores orgasmos da terra não passam de bolachas estragadas, nem chegarão a ‘balançar’ os seus “visitantes”, e muito menos empolgar. As beatíficas almas vistas ali serão encaradas como loucos varridos, que sentem orgasmos com bolachas estragadas!

amor além da vidaMas nos desviamos muito da verdade do Purgatório na declaração de Jesus para o bom ladrão (que de bom não tinha nada – ainda –, nem poderia ter, já que não teve tempo para a longa caminhada de regeneração). Logo, por tudo o que vimos nestes três últimos post de nossa Escola, Jesus foi obrigado – por óbvio – a fazer um resumo forçado na resposta ao bom ladrão, acerca da chegada deste ao Paraíso. Assim, se Jesus tivesse tido tempo na ocasião para se explicar melhor, ao ouvir o homem dizer: “lembra-te de mim quando entrares no teu Reino”, Jesus teria respondido: “Não se preocupe: um dia você estará comigo no Paraíso. De minha parte, você já pode entrar. Mas de sua parte, você ainda precisa limpar todo o seu interior dos vícios que pegou em sua vida bandida, e uma das coisas que precisava fazer (mas agora nem poderá mais fazê-lo) era devolver tudo o que roubou e renunciar aos prazeres auferidos com o dinheiro roubado! E como lá no meu Reino um dia pode ser mil anos e mil anos um dia, então você poderá entrar no Céu daqui há mil anos ou no mesmo dia em que estiver 100% limpo de seus vícios e assim conseguir gostar das ofertas encontradas no Paraíso”.

Com esta resposta de Jesus, o bom ladrão faria mais uma pergunta ao Mestre, a última: “Então Senhor, se não vou gostar do Céu e não quero ir para o Inferno, para onde irei?”. Jesus responderia: “Ficará no Vale Enfumaçado das almas ‘em assepsia’, purgando os vícios aprazíveis que Tellus lhes ensejou enquanto estavam na carne. É um lugar só de ‘fumaças’ (almas não solidificadas pela Graça) e sem sofrimento físico, promovendo a limpeza anímica por sofrimentos espirituais. Meu filho Davi chamou aquele lugar de Vale da Sombra da Morte e minha Noiva Igreja chamou de Purgatório, mas não importa o nome. O que importa é que você não vai para o Inferno (que não foi preparado para almas humanas, e sim para demônios). Você ficará no Hades, e lá poderá experimentar a sua verdadeira liberdade, quando enfim estiver 100% santo”.

Almas no Hades sendo visitadasContinuaria Jesus: “Meu filho CS Lewis um dia contou que ficou perplexo quando descobriu que poderia passar um bilhão de anos no Hades(**). De fato, não sei qual angústia é maior: demorar tanto para ter a paz eterna do Reino, ou entrar na paz e se sentir incapaz de ser feliz naquele ambiente”. Talvez nessa hora, Jesus fizesse seu último apelo aos ouvidos daquela alma, e Jimmy Page o transformasse num lindo solo de guitarra. Aliás, pegando carona aqui, o Grupo ‘RBD’, de atores-cantores adolescentes, um dia tocou ao nosso coração uma canção belíssima, em cuja letra (com pouquíssimos “ajustes” à doutrina) está explicada com perfeição a situação de uma alma no Hades. Veja o que diz a sua incrível letra no site “letras.mus.br”, e o leitor poderá ver a sua interpretação NESTE link.

“Hoje mesmo estarás comigo no Paraíso”, é a coisa mais linda que se lê nos evangelhos. Todavia e contudo, pela lógica de Pedro, isto pode demorar mil anos. Se um leitor casual destas linhas estiver olhando agora para este final, creio que posso lhe dizer: “se eu já tiver conseguido na terra uma débil migalha da santidade da menor alma que está no Céu, já terei todas as razões para ser a alma mais feliz dos filhos de Deus. Porém se não, se nenhuma pureza eu tiver em mim, jamais permitirei a minha própria entrada no Céu, pois eu nunca suportaria ver almas inocentes serem influenciadas pelas minhas entranhas ainda sujas. Logo, vou começar agora mesmo minha vida de oração e santidade”. Quem tem ouvidos de ouvir, que ouça.

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Chamadas do texto (asteriscos):

(*) – Dissemos que a salvação é uma coisa e a conversão é outra completamente diferente, mas não é bem assim, pois a primeira não pode ocorrer sem a segunda, e por isso, as duas são literalmente a mesma coisa. Uma alma que já creu firmemente na obra de Cristo e na sua santa Ressurreição, já teve de Deus toda a ajuda necessária para salvar-se; mas ela mesma não irá querer morar no Céu, enquanto o vício que a levou a afastar-se de Deus não for vencido por uma efetiva lavagem moral. É por isso que não se pode dizer que alguém está salvo sem que seu processo de conversão não tenha sido concluído, e ele só se conclui após um tempo no Purgatório. É isso o que ensinou Lewis.

(**) – Lewis mencionou o drama de passar um bilhão de anos no Hades em seu livro “Oração – Cartas a Malcolm”, Ed. Vida, 2009, na última Carta (XXII), pág. 156, último parágrafo, com as seguintes palavras: “Então os novos terra e céu, os mesmos ainda que não os mesmos que destes, ressuscitarão em nós assim como temos ressuscitado em Cristo. E mais uma vez, depois de sabe-se lá quantos bilhões de anos NO SILÊNCIO E NA ESCURIDÃO, os pássaros cantarão e as águas fluirão, luzes e sombras subirão morro acima, e a face de nossos amigos rirá para nós em maravilhado reconhecimento”. Fica claro aqui que, numa só frase [por nós negritada], Lewis não apenas mostra o dado desconhecido para qualquer alma após a morte (o seu tempo de estada ali), quanto insinua fazer a Deus-pai um sutil apelo por um abreviamento daquela estada, pois sua razão deseja ardentemente estar logo na Santa Presença, ao lado de todas as almas já glorificadas. Este apelo pungente é precisamente o que fazemos nós cristãos vivos, quando oramos pelos mortos e sufragamos missas.

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