Por que Jesus haveria de pedir alguma coisa ao Pai?

O insistente registro das ocasiões em que Jesus orava deixa no ar uma mensagem toda especial: Se Ele “era” Deus e sabia de tudo, orar a si mesmo nos pede para ver que o Reino de Deus tem hierarquia e que ela deve ser procurada para atendimento das nossas petições.

Toda a discordância – que já virou discórdia – entre o Protestantismo e o Catolicismo, sem levar em conta a questão do erro de interpretação da “idolatria” católica, reside no fato de que os chamados “crentes” passaram a crer, a partir de Martinho Lutero, na ideia anticatólica de que todas as petições humanas podem e devem ser dirigidas APENAS a Deus, e a mais ninguém. E isto pode, sem dúvida, suscitar a falsa sabedoria de que “se Deus é onipotente, não é necessário pedir a mais ninguém além dEle”; “se Deus tem dois ouvidos, não precisamos de nenhum outro ouvido para suplicar”. É este o ponto onde quedam todos os protestantes, convencidos de estar assumindo uma transcendente racionalidade.

E vamos entrar nela agora… Por que não? Ora; sim e sim: Deus é onipotente… É infinito… É o Todo-poderoso. Isto é dogma irrevogável de toda a Cristandade. É aquele ponto onde ninguém discute. Sim… Mas Ele também é soberano, é imperador, é monarca, é Rei… E reis possuem reinos. Reinos possuem súditos, súditos possuem postos. Postos possuem missões, missões distribuídas pelo Rei! Será que este outro ângulo da questão é difícil de ver? Será que este outro ângulo foi propositalmente negligenciado pelo Protestantismo como forma de denegrir não o “Cristianismo Puro e Simples”, mas o Cristianismo Puro e Complicado da Revelação bíblica? Será que esta forma de denegrir o Catolicismo não foi antes de tudo uma maneira subreptícia de demarcar, politicamente, o lado Conservador e o lado Progressista da Cristandade?

Também pudera! Os pecados íntimos de Lutero o levaram fatalmente, como os nossos pecados também levam inexoravelmente, a ir de encontro à autoridade eclesial (lembre que Deus também é uma autoridade eclesial!) e esta o tolerou e tolerou e tolerou, até que sua tentação superou suas forças e o obrigou a gritar forte, ao ponto de ele afixar 95 teses na frente da igreja, sem mais se importar de estar indo contra a autoridade canônica (única que podia ter a palavra final)! Afinal, é assim que as coisas caminham na escalada de adesão a ideias vindas do inferno – porquanto o inferno antevia e sonhava com o dia em que haveria dois, três, quatro ou mil “cristianismos” sobre a Terra, e assim o futuro lhe daria a arma decisiva da confusão, da pluralidade e da relatividade da religião trazida por Cristo. Com mil cristianismos, ele estava com a faca e o queijo na mão para sussurrar nos ouvidos perdidos: “por que você vai aderir a esta denominação, quando há esta outra e esta outra e esta outra?”. Logo, desobedecer à autoridade – a todas as autoridades, segundo Paulo (Romanos 13,1-2) – era e é sempre a proposta final de satanás, e os nossos pecados é que nos fazem ficar surdos à voz de Deus oculta na autoridade humana, sobretudo quando ela é sacerdotal ou canônica.

Assim Martinho Lutero foi empurrado por algum pecado íntimo – para pensar só em um – que estava sendo obstaculizado pela repressão e repreensão da Lei, presente nos olhos da autoridade eclesial, e por causa dele acabou caindo como caem todos os pecadores: se rebelam e depois se separam! Pior: a desobediência brotada a partir do plantio da malícia interior traria também a cegueira óbvia, que o fez não ouvir sua própria lógica: “Se eu sou um servo de Deus, um servo ordenado e sacramentado, Deus certamente me ouvirá, se eu de fato tiver razão; assim sendo, e como a Escritura que julgo obedecer me diz que eu devo pedir tudo em oração – e crendo receberei – e que devo ser PACIENTE em esperar no Senhor, e vendo que o prejuízo de dividir o Corpo de Cristo será muito pior para o próprio Deus, então devo calar-me a aguardar pacientemente, pois se eu estiver certo nos pecados que aponto na Igreja, o próprio Deus a corrigirá, seja por bem ou por mal”.

Isto tudo prova que Lutero foi impaciente e NÃO CONFIOU na resposta de Deus (nem no tempo de Deus) e por isso agiu por impulso de pecado, provocando o maior de todos os prejuízos ao Evangelho de que se tem notícia desde o nascimento do Cristianismo! – Pior, o próprio Jesus a quem ele acreditava seguir, demonstrou concordar plenamente com TODAS as hierarquias, as quais vão desde a hierarquia no lar (ali o homem é o cabeça e a mulher o obedece – I Pedro 3,1-6) até a hierarquia militar das Forças Armadas, que muitos consideram “assassina”, e à qual Jesus jamais se opôs, pelo contrário, elogiou a quem a obedecia até mais que os filhos de Israel! (Mateus 8,5-13).

Com isso vemos aí em desfile pelo menos três pecados em Lutero, e foi assim que o Protestantismo nasceu, e com ele os seus filhos doentes e degenerados, chamados Testemunhas de Jeová, Mórmons, Adventistas, Presbiterianos, Neopentecostais, etc. Nem é preciso rebuscar mais na memória para concluir que, de uma religião que nasceu de uma desobediência, só poderia advir uma corrente desobediente, e com ela a relativização de todas as hierarquias, sobretudo as hierarquias DO REINO DE DEUS, soterradas ou embaçadas no erro teológico da criação de um Reino sem hierarquia!

Porém tal não há. A ordem está presente em tudo no coração de Deus, e também em tudo o que Ele cria. A rigor, Ele nunca deixou de lado a hierarquia, até porque ela é, ao final, a única garantia de que qualquer coisa funcionará a contento, e também a garantia de detectar aonde e como o mal pode penetrar, já que qualquer desobediência a Deus resulta em prática da maldade.

Mas Deus queria a obediência levada às últimas consequências! Queria que seus filhos diletos demonstrassem o seu amor a partir da obediência do primeiro mandamento, e Ele mesmo adicionou à ideia original à condição dela decorrente: “amar ao próximo como a mim mesmo”. Não era apenas amar ao próximo como a ti mesmo! Era amar ao próximo como a mim mesmo, sendo o “mim” o próprio Deus! Ali estava a espinha dorsal do Reino de Deus, pois ninguém poderia amar sem obedecer e nenhuma obediência seria sinal de amor, se obedecesse somente a Deus e não ao próximo instituído por Deus como autoridade! Aqui a visão do Reino fica mais clara.

O Reino celestial está cheio de santos e santas, todos entronizados por Deus em condições e missões especiais, pelo menos enquanto durar a vida de pecado na Terra. E na Terra, Deus está vendo quem ama ao próximo e quem não ama. Ou seja: quem obedece e quem vive em rebeldia. Mas quando uma pessoa viva ama o próximo (ao ponto de obedecê-lo) e obedece às autoridades instituídas sobre a face da Terra, está, no fundo, obedecendo a pessoas que ainda possuem pecados, e por isso as obedece porque mesmo assim Deus lhe pediu sua obediência (Romanos 13,1-2)!

Como então este sistema da Terra não iria vigorar na pátria celestial? Se na Terra obedecemos a pecadores, como não obedecer aos santos do Céu? E se na Terra, precisamos das autoridades “defeituosas” para conseguir resolver nossos problemas, por que não iríamos precisar das autoridades santas que visitam todo dia a face do Senhor? Eis porque orar aos santos é uma instituição divina, e também eis porque os santos podem atender nossos pedidos de interseção, pois ao visitarem a face de Deus diuturnamente, também levam a Ele as nossas orações e as nossas súplicas por ajuda, e o coração de Deus é MOLE e GRANDE DEMAIS para não dar ouvidos aos santos que já subiram aos céus!

O coração de Deus é mole como um gigante feito de chocolate sob a luz do meio dia.

Mesmo vendo que talvez nem era preciso pedir a ninguém (o mero sentir necessidade já pode ser atendido – Mateus 6,8 –, segundo Jesus) e nem a santo algum ao lado dEle, Ele ouve tais pedidos com uma alegria infinda por ver que o pedinte está RESPEITANDO a Autoridade da Hierarquia, ou seja, que já assumiu o “espírito de obediência” da alma mais amada por Ele, pois só aquela 100% obediente pode ser 100% humilde e livre de presunção! Eis a pedra de toque.

Enfim, por que o próprio Jesus pedia alguma coisa ao Pai, quando Ele já sabia de tudo e já sabia que era atendido total e peremptoriamente? Por que revelar aos discípulos (e ao público em geral – João 11,42) que o próprio Deus-filho orava a Deus-pai? Ora, porque todo pai é autoridade para o filho, e todo bom filho obedece ao pai! Logo, na relação de 3 pessoas da Trindade, mesmo não sendo necessária, a Hierarquia subsiste, e até ali a obediência é a Regra e a Lei.

Num Reino onde há um pai, um filho e uma terceira pessoa na Trindade, o pai continuará sendo a Autoridade máxima, e seu filho O honrará com sua obediência eterna. E esta obediência foi chamada pela Escritura de “advocacia” de Cristo (I João 2,1) e Ele mesmo foi entronizado como o nosso “Intercessor”! Intercessor é a pessoa que intercede a favor de outrem, e por isso nossas orações são endereçadas ao Filho, embora possam ser endereçadas ao Pai. Porém um pedido ao Filho demonstra uma dupla obediência: à Autoridade de Deus e à autoridade da hierarquia, que deve ser respeitada em todas as instâncias!

Então Jesus Cristo deixou-nos um exemplo vivo de como devemos orar, respeitando a Deus e à hierarquia que Ele instituiu no seu Reino! E lá no seu Reino há tronos, principados e poderes, cargos e funções. Assim como numa empresa você pode procurar falar com o Presidente, marcando hora com sua secretária, ele ficará muito honrado por saber que você já procurou outras instâncias e não foi atendido, e por isso teve que ir à presença dele e tomar-lhe tempo.

Está delineado todo o quadro devocional e orante da “economia da salvação”:

(1º) Nós a rigor nem precisávamos orar, porque Deus já conhece nossas necessidades e sabe o que será melhor para nós, antes mesmo de lhe pedirmos algo;

(2º) Nós podemos orar diretamente a Deus, porque Ele ouve tudo e será, ao final, o principal responsável pela decisão final de nos ajudar;

(3º) Nós podemos orar diretamente a Jesus, porque Ele mesmo se colocou como nosso advogado e intercessor; então Ele mesmo convencerá o seu Pai de que merecemos (ou não) ser atendidos; Isso também O agradará pelo respeito que demonstramos pela hierarquia do Céu, na qual Ele foi instituído como nosso Advogado;

(4º) Nós também podemos orar à Mãe de Jesus, a principal santidade humana do Céu, pois ela própria intercedeu junto ao seu Filho nas Bodas de Caná, orientando-O a dar início à sua missão de salvador da Humanidade (Jesus afinal, como filho amado e amantíssimo de sua Mãe, jamais a entristeceria negando-lhe atender um favor em favor de um outro filho seu, perdido em meio a um planeta perigoso e cheio de armadilhas, inclusive hermenêuticas!); Jesus também ficaria feliz por ver, no pedido à sua mãe, o extremo respeito do pecador à hierarquia de seu Reino (Daniel 4,17);

(5º) Finalmente, nós podemos orar a outro santo, na confiança de Jesus ou de Maria, pois aquele a quem Jesus confiar merece toda a nossa confiança. Afinal, no Céu só habitam santos 100% santos, e estas criaturas são, a partir da salvação em Cristo, as maiores alegrias que seu Pai tem no seu Reino, pois quanto mais pecador tiver sido outrora um daqueles santos, mais alegria deu e continua dando no meio do Paraíso dos salvos! (Lucas 15,7 e 22-32).

Eis aí expostas todas as cartas deste baralho divino que Lutero não soube respeitar. Eis aí a luz deste inefável encontro da necessidade com a Autoridade, da verdade com a bondade, que encontraremos no Paraíso escatológico de Jesus. E o que esperamos encontrar ali quando enfim botarmos nossos pés outrora trêmulos? Bem. O que você espera encontrar lá eu não sei. Mas o que eu esperarei sentado confortavelmente numa poltrona de uma secretaria toda atapetada em ouro e cristal, é ouvir o tilintar do sino de chamar justos, aqueles que confiaram tanto na organização celestial que ganharam humildade “conversando” com os humildes glorificados, porque descobriram que o Senhor adora atender a essa gente que no mundo não tinha voz nem vez (Tiago 4,3-6 e 5,16).

 

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