Quando os ficcionistas não fazem ficção

Diz-se comumente que CS Lewis foi o autor das Crônicas de Nárnia, das Cartas do Inferno, dos diálogos do Grande Divórcio, mas talvez isso não seja totalmente verdadeiro.

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Um homem com a “estatura de Cristo”, para bom entendedor, não se ofenderá absolutamente (muito pelo contrário) se ouvir alguém dizer que as suas obras, livros e discursos, não foram criações dele, e sim foram “interpretações” ou mesmo “cópias” de material alheio, sobretudo se este material for o sumo perfeito da Palavra de Deus, pela qual ele teria sido diretamente inspirado. Para este articulista, foi exatamente isto o que aconteceu com CS Lewis, auto-apelidado “Jack”, a quem dedicamos este artigo. Nele explicarei porque nem sempre os ficcionistas “inventam suas histórias”, ou antes, pelo contrário, como é comum contarem uma verdade que apenas parece ficção.

Como Lewis escreveu muito (uns 40 livros), serei obrigado a reduzir os pontos de meu argumento a uns poucos exemplos, procurando coincidir o máximo possível as suas “criações” com aquilo que a Bíblia Sagrada traz, seja nas suas linhas ou entrelinhas. Ater-me-ei, até por relação lógica, aos livros ditos “ficcionais”, nos quais poderiam estar coisas retiradas da própria mente de Jack, como se ele as tivesse pensado primeiro. Farei as citações e, junto com elas, direi a quais livros pertencem.

Lewis chamou o mundo dos mortos de Terra das Sombras, ou “Shadowlands”, por se referir às almas como “fumaças”, seres tênues ou fluídicos, os quais não tinham consistência densa para pegar e levantar objetos (livro “The Great Divorce”, “O Grande Abismo”). Pois bem. Isto está nas Escrituras Sagradas, nos livros de Jó 10,21 e 12,22; Sl 37,20; Is 26,19 e Ap 9,2 e 14,11.

Jack disse que existem animais estranhos na Terra (Criptozoologia), ou que pelo menos outrora existiram, um dos quais chamado de Unicórnio pela Mitologia, mas jamais menosprezado como mito por CS Lewis. Ele escreveu abertamente sobre unicórnios em suas Crônicas de Nárnia, sobretudo no último livro (“A Última Batalha”), chamando seu herói eqüino de “Precioso”, por sua coragem e heroísmo, sem deixar nenhuma dúvida de sua existência – embora a maioria dos “crentes” acredite que os animais mitológicos em Lewis eram apenas alusões metafóricas a seres celestiais, e não terrestres. Todavia, a tradução da Bíblia por João Ferreira de Almeida, publicada pela Sociedade Trinitariana, traz os unicórnios em diversas passagens, tais como: Nm 24,8; Sl 22,21; 29,6; 92,10; Jó 39,10 e Is 34:7, o que põe fogo na fogueira pela impossibilidade de se negar veracidade às Escrituras.

Disse que as estrelas são anjos, anjos que podem vir à Terra em missão especial, na qual se transformem em seres humanos, como ele mostrou nas personagens de Ramandu e sua bela filha, muito bem protagonizada no 3o filme das Crônicas, “Viagem do Peregrino da Alvorada”. A Bíblia também diz a mesma coisa, e o leitor pode conferir isso lendo passagens como os salmos 147,4 e 148,2-4, afora outros salmos e estranhas referências de Paulo e do próprio Cristo, como em Hb 13,2 e Mc 9,1. A própria Estrela de Belém, que guiou os magos, pode e deve ser um anjo de anunciação, iluminando o Caminho que mais tarde João Batista aplainará.

Lewis escreveu histórias de faunos e seres ditos “mitológicos”, e estes seres têm um papel relevante na história de Nárnia. Alguns deles são citados na Bíblia Sagrada, ao lado de outros, como o leitor pode ler em Isaías 13,21 e 34,14.

Há uma sutil e rápida passagem no livro “Perelandra” (cap. 1, pág. 5), onde Lewis revela a existência de objetos materiais que servem de veículo para anjos e outros seres divinos, o que está endossado pela palavra do profeta Ezequiel (Ez caps. 1 a 3 e 10,13), quando ele contou a sua experiência ufológica às margens do Rio Quebar. Ali o profeta não apenas fala de veículos para seres angélicos, como os descreve como sendo de “metal polido” e em forma redonda ou discóide, chamando-os de girantes ou “rodas volantes”. Na tradução mais recente da CNBB, o versículo Ez 10,13 diz o seguinte: “Ouvi que as rodas eram chamadas veículos”.

Em algumas mui tocantes passagens bíblicas, Jesus é apresentado como o Leão de Judá, e este Leão saiu das páginas das Escrituras para as Crônicas de Nárnia, onde Lewis nos apresentou o Grande Aslam, Filho do Imperador de Além-mar, e encantou o coração de crianças e adultos, encharcando os olhos de muitos. As passagens bíblicas que falam de Jesus como Leão são: Gn 49,9; Os 5,14 e 11,10; e Ap 5,5.

Jack também apresentou uma arrojada visão do mundo inteiro, descrevendo-o como um mero e ínfimo orifício no chão da imensa ante-sala do paraíso, na qual Lewis se encontrou após “subir de ônibus” até a Escola Celestial onde George MacDonald lhe ensinou tudo. Esta visão do ínfimo microcosmos onde vivem os humanos também é bíblica, e ela pode ser comprovada pelas “insinuações incidentais” que os livros de Jó (38,16), Sl (8,4) e Mt (11,11 e 13,32) dão acerca da morada dos homens.

Neste mesmo espírito revelador, Lewis conta que a Região dos Mortos, chamada pelo Salmo 23 de “Vale da Sombra da Morte”, pode ser entendida como um abismo (não o abismo de Lc 16:26, mas o de Is 59,2), no qual estagnam ou involuem as almas rebeldes ali chegadas com a morte, e cuja salvação depende de mais uma vez abrirem seu coração à pregação de Cristo no Hades, como explicitada por Pedro em I Pe 3,19 e 4,5-6. As almas não-rebeldes, ou das pessoas que morreram sem negar a Cristo, facilmente subirão ao Céu na figura do “Ônibus de Lewis”, a qual pode ser entendida como o “veículo dos anjos” entrevisto nos trechos de Lc 16,22 e Sl 91,11. Interessante destacar a nova tradução bíblica da CNBB, a qual assim traz Is 59,2: “Ao contrário, vossas injustiças é que viraram um abismo a distanciar-vos do vosso Deus, foram vossos pecados que esconderam a divina Face, impedindo-o de escutar”.

Finalmente, o livro “Cartas do Inferno” também apresenta o demônio como um “vampiro”, chamado “Morcegão” (murecaecu ou “murcaecus”, que daria “murciegus”), entidade devoradora de almas que atenta constantemente as personagens do livro, sobretudo um certo cidadão cristão que um demônio jovem, apelidado por Lewis de “cupim” (“kopi’i”, o corrosivo), tenta fazer cair na eterna guerra entre o bem o mal no coração do Homem. Interessante notar um estranho mas perfeito paralelo entre este livro e as duas primeiras Crônicas de Nárnia: existe um diabo responsável por destruir as últimas provas do guarda-roupa mágico, e ele se chama cupim! Isto é um verdadeiro “missing link lewisiano”! Todavia o diabo devorador, ou antes, a fome anímica de satã, é apresentada na Bíblia com outras figuras, inclusive como um leão maligno (o oposto de Aslam), o qual está sempre ao redor de nós tentando nos consumir ou exaurir nossas energias, como pode ser visto em I Pe 5,8.

Isto tudo nos leva ao título de nosso artigo, o qual indiretamente diz que Lewis não inventou nada, e agora o leitor já pode comprovar tal assertiva. Como alguém poderia inventar algo que outro já descreveu? Ou como tratar como seu aquilo que outrem já havia publicado? Portanto, Lewis precisaria ser um cínico ou um falso cristão para plagiar trechos e figuras “inventadas” ou reveladas por outros, sobretudo quando tais matérias se encontram na Palavra de Deus, livro que Lewis respeitava em primeiro lugar em sua vida. Isto basta. Se o leitor ainda tiver alguma dúvida, poderá ver o próprio Lewis pedindo “desculpas” por usar as figuras de outros, como no caso da “chuva cortante” que caía sobre as costas dos fantasmas, em seu livro “O Grande Abismo”. Por último, se o leitor gosta do assunto e quiser mais conteúdo, procure um livro chamado “O Grande Divórcio do Egocentrismo” e um outro chamado “Você é um fantasma e não se enxerga”, sem qualquer ofensa…

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