O cheiro de Jesus é um perfume de mulher

Espalhado dentro da manjedoura logo após nascer e no mundo todo emanado pela igreja, o perfume de Cristo se comunica de modo sutil mas inconfundível para os melhores olfatos cristãos.

Moça cheira flor-2

É uma reflexão que só pode ter sido feita por alguém em plena intimidade com Deus, como Santa Tereza e São João da Cruz, ou em plena entrega da inteligência ao seu Criador, como C.S. Lewis. É também uma honra inefável ser veículo dela, como supõe este humílimo servo, que não faz a mínima ideia da razão de tão incompreensível honra, vez que sem merecimento. Por último, vai exigir tremendo exercício mental e bíblico para colher, em alguns leitores, uma leve brisa do que subsiste sob a sombra da árvore mais frondosa do Paraíso. Que nós todos possamos captar tudo para a alegria do Senhor.

Nestes últimos anos, tenho entrado e saído muitas vezes de minha igreja e de outras que visito, tanto aqui no Ceará quanto no Maranhão, terra de minha mulher. A última década deve ter inaugurado um período no qual alguma coisa superior aconteceu, sem dúvida, e eu falo isso me lembrando de uma série de ocorrências estranhas, algumas bem sinalizadas, que meus olhos puderam ver e meus ouvidos ouvir. Até poderia dizer que, se tudo se encerrasse nisso, talvez nada demais merecesse comentário, e meu discurso morreria aqui. Todavia não é possível negar que, em dois horizontes de eventos, meu olfato melhorou bastante, ao mesmo tempo em que meu Salvador parece ter-me cercado de modo muito mais “paternal” (em seu irrevogável direito de ir e vir), como que antevendo a melhor idade da surdez e da desintegração da carne. Logo, está na lógica normal dos acontecimentos supor que a década passada foi uma chamada multidimensional de Deus, ou dentro dela Deus introduziu formas inauditas de chamamento, como se cada sinal encaminhasse uma bênção correspondente, nem sempre “captada” pelo chamado.

Então, devido a esta multiplicidade de sinais, decidi escrever sobre um em particular, o qual só de leve perpassa as discussões e pregações cristãs.

Todos se lembram que dentro dos Cânones e da Tradição cristã, quando os três reis magos (talvez houvesse um quarto, nos dois sentidos) chegaram à aconchegante manjedoura, fizeram doação de três presentes ao bebê Menino-Jesus e um deles foi um frasco rijo de perfume finíssimo do Oriente, chamado “mirra”, que ainda hoje é respeitadíssimo e caro no comércio mundial. Quase numa daquelas “coincidências inexistentes”, o cheiro das fezes do gado que dormia no local não poderia receber e muito menos agradar ao nobre Rebento de Israel, e por isso aquele perfume foi o escolhido previamente por Deus, atenuando ou aliviando os narizes do mau cheiro de um curral. Ao mesmo tempo, pode-se lembrar que o Menino-Jesus carregava o cheiro divino de Maria e também possuía pele 100% límpida, com aquele cheirinho maravilhoso de bebê que todo mundo gosta de cheirar. Mas uma coisa às vezes escapa de nossas lembranças: Maria era quem cuidava do Bebê, e os cheiros dela também eram dele, e quando ela não os tinha (pelo suor de seus muitos afazeres de mãe sofrida), ela não O deixava jamais malcheiroso, mesmo após o Seu bebê defecar. Era como dizer que quando faltava perfume nela, o pouco que restava ela colocava no Filho: o que dá na mesma, bem entendido, pois os perfumes eram dela (os perfumes do quarto de um bebê são da mãe do bebê).

Jesus cresceu. Maria o levou a uma adolescência sadia e bem educada, e fê-lO um Homem com inicial maiúscula. Entretanto, desde cedo, os sinais divinos da missão dEle se faziam presentes, e Maria talvez fosse a única a vê-los todos, devido o olhar profundo e intuitivo de mãe. Sua natureza feminina também jamais se esquivava de todo, e vez por outra deixava seus sinais de boa vontade, bondade e benquerença, aflorarem, e muitas vezes só o Filho primogênito os via. Este foi sempre bom aprendiz dela e de seu pai, e com ele aprendeu bem o lado masculino da vida, a exceção da imoralidade, dada a santidade e fidelidade de José. Aprendeu a trabalhar, e a trabalhar pesado para se manter, nos ofícios de carpinteiro de seu pai adotivo, mas nem por isso menos amado. Nos ofícios do pai derramava o seu precioso suor sem descanso, muitas vezes em trabalhos duros que lhe levaram a enrijecer os músculos e fortalecer coração e pulmões. Dado este labor medonho, não podia ser um homem muito cheiroso ao fim do dia, e só voltava a cheirar bem após o banho tomado na casa de sua mãe, dona dos melhores perfumes (os de alabastro e os da pele dela mesma). Ela própria ficava mais cheirosa à noite.

A vida inteira do Nazareno foi, sem sombra de dúvida, uma vida regada por Nossa Senhora, nos dois sentidos, e ao final do processo terrestre (após 33 anos de convivência), os perfumes dela acabaram impregnando-se nEle, e Ele nunca mais cheirou diferente. Ele ainda hoje sabe e diz aos quatro ventos que “experimentou o verdadeiro perfume de mãe, e nunca jamais cheirou coisa melhor em toda a sua Criação”.

Maria linda com Jesus2O mais impressionante é que o raciocínio em torno de Maria pode aprofundar-se, e chegar a algumas conclusões bombásticas. Senão vejamos:

  1. A pele de Maria deve ter sido forjada com uma genética bem favorável aos bons cheiros, e ela deveria ser aquele tipo de mulher que atualmente se diz “naturalmente cheirosa”, onde quase não era preciso esforço algum para agradar aos olfatos de onde quer que ela entrasse (afinal, por ser uma mulher pobre, não podia comprar perfumes caros; e por viver numa terra quentíssima, e sem as atuais condições de abastecimento d’água do moderno Israel, certamente não tomava tanto banho como nós e talvez suasse muito com seus afazeres domésticos);

  2. Seu cheiro natural devia ser do tipo “impregnante”, como muitas mulheres demonstram ter hoje, e a ciência já explicou que alguns tipos de pele humana são mais favoráveis a “guardar” em si – ou pelos poros – as fragrâncias que põe sobre o corpo, e é por isso que algumas mulheres perfumam mais fortemente os ambientes que frequentam.

  3. Tendo esta doce condição de espraiar seu perfume natural, Maria pode muito bem ter esta virtude amplificada após o seu desencarne e chegada ao Paraíso (“se o ladrão da cruz chegou no mesmo dia, por que os crentes tremem ao falar da assunção de Maria aos céus?), passando a somar e somatizar seu cheiro com o de Jesus, ou mesmo dando a este o indelével perfume de mãe que Ele tanto amava.

  4. Emitindo seu aroma celestial dentro do Paraíso e até perfumando seu próprio Filho, está na ordem normal dos acontecimentos que o cheiro de Maria chegasse à sua filha amada, a Noiva de Jesus (a noiva mais cheirosa de todas), a Igreja, e sem dúvida os espíritos mais sensíveis e com maior comunhão com Deus poderiam sentir isso, e não é à-toa que os ambientes bucólicos e calmos dos templos católicos infundem tanta paz e graça aos que lhe visitam.

Aqui chegamos ao “x” da questão. Quando se trata da Igreja terrestre, o cheiro é ainda mais sutil. Uma igreja é a casa de Deus, como foi um dia a manjedoura. Na casa-de-Deus-manjedoura reinam os perfumes que os cristãos doam ao Menino-Jesus, em forma de espiritualidade, boas obras e amor ao próximo. Mas também devem reinar os perfumes de Jesus e Maria, e os perfumes dEle têm em si o carinho e os cuidados de mãe, zelosa para com “as boas aparências” do Filho. É assim, pois, indispensável conhecer mais a fundo acerca de Maria, perfume de Cristo.

Conclui-se pois que, conquanto a Noiva do Senhor seja santa e pecadora, ou que viva num ambiente de pecado como o mundo, os perfumes divinos da santidade do Filho de Deus, cuidados pelo carinho eterno de sua Mãe, terminam por transparecer ao olfato mais acurado dos místicos e cristãos santificados, como alegaram os grandes santos da História cristã. Uma igreja, então, que cuide tratar bem da missão do Salvador, sentindo-se porta-voz da mensagem salvífica, não deveria prescindir do auxílio missionário de Maria, mãe da Igreja e primeira crente, já que a difícil tarefa de levar a mensagem de Deus (i.e., a dureza do arrependimento e da conversão) chega muito mais agradável quando o ouvinte sente o perfume celestial, mesmo quando os missionários pregam após um longo dia de caminhada “no sol quente”.

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